Comunidade israelita homenageia Pelotas pelo bicentenário

         





            Durante as comemorações dos 200 anos de Pelotas, o município recebeu, ontem (6), uma homenagem da Comunidade Judaica. Por volta das 19h foi descerrada uma placa, no hall do Paço Municipal, com presença do prefeito Adolfo Antonio Fetter, do presidente da Federação Israelita do Rio Grande do Sul (FIRS), Jarbas Milititsky, e da presidente da Sociedade Israelita de Pelotas (SIP), Nirce Medvedovski, como agradecimento pela acolhida do município aos imigrantes judeus, a partir de 1907. Na sequência, prefeito e convidados seguiram para o Salão Nobre, onde a solenidade teve prosseguimento.

          Após os discursos de Nirce e de Milititsky (abaixo, na íntegra), o prefeito Fetter fez um breve relato sobre judeus que foram importantes em sua vida pessoal e agradeceu as importantes contribuições deste povo para a cultura pelotense – que conta com quase 30 diferentes etnias. Ele entregou aos dois presidentes material impresso sobre a cidade de Pelotas, como símbolo de sua gratidão à comunidade judaica, e recebeu um CD do conjunto Lechaim, “Do jazz ao samba – homenagem aos músicos judeus”, que apresentou diversos números musicais na ocasião.

          Segundo a Sociedade Israelita de Pelotas, na atualidade o Município conta com cerca de 60 famílias de origem judaica, mas a estimativa é que este número beire os 150 se forem contados os descendentes dos primeiros imigrantes. Nirce lembrou que, apesar de terem começado a trabalhar como mascates (vendedores de porta em porta), assim que aqui chegaram, os judeus logo abriram estabelecimentos de comércio de tecidos e móveis e, com isso, conseguiram sustentar os estudos de seus filhos, que hoje exercem as mais variadas profissões na cidade - médicos, dentistas, farmacêuticos, engenheiros, agrônomos, entre outras. 



Discurso de Jarbas Milititsky, presidente da FIRS, na solenidade:

Exmo Sr Prefeito municipal 

Senhora Presidente da Sociedade Israelita de Pelotas 

Membros da comunidade israelita de Pelotas, Cidadãos desta cidade 

Minhas senhoras e meus senhores 

É uma honra e uma satisfação para nós, da Federação Israelita do Rio Grande do Sul – entidade que representa a comunidade judaica do Estado, a participação nas comemorações do Bicentenário da Cidade de Pelotas. 

Em 1891, o Barão Maurice de Hirsch – filantropo judeu alemão radicado na França, preocupado com a perseguição ao povo judeu, especialmente aos judeus russos, criou a Jewish Colonization Association - ICA, com o objetivo de organizar e instalar colônias agrícolas no Brasil, Argentina e Canadá. Os judeus que vieram desconheciam a língua, o ofício de agricultor e a geografia do lugar, mas foram acolhidos generosamente pelo povo do Rio Grande do Sul. 

A história da imigração judaica para Pelotas é peculiar. Os primeiros imigrantes judeus a chegarem por aqui, dos quais temos conhecimento, foram os Millman e os Galanternick, estima-se que tenha sido entre 1907 e 1910. Mas, a grande maioria dos imigrantes aqui chegou entre os anos de 1920 e 1930. 

Em torno de 100 famílias passaram a residir em Pelotas. Fundaram associações representativas, cooperativas de crédito, uma escola, bibliotecas, sinagogas, um cemitério. 

Os que aqui chegaram eram de origem sefaradim ou azquenazim e, em muitos casos, haviam passado pelas colônias de Philippson ou Quatro Irmãos, quando não tinham estado anteriormente nas colônias argentinas da ICA. 

Viveram os primeiros tempos vendendo a prestações, roupas, gravatas, pequenos objetos, em bairros periféricos. Já estabelecidos, possuíram lojas de tecidos ou de móveis, pequenas fábricas e até indústrias. Seus filhos foram médicos, advogados, magistrados, professores, integrando a sociedade local. 

À medida que os anos vão passando, a trajetória dos imigrantes também alterou- se., A partir de 1926/27, quando da fundação dos núcleos de Barão Hirsh e Baronesa Clara, o Rio Grande do Sul praticamente não recebeu mais colonos judeus e também porque a comunidade judaica em Pelotas se encontrava bastante organizada, tendo condições de acolher 

novos imigrantes, que na maior parte das vezes, vinham com imensas dificuldades financeiras. Sendo assim, um número significativo chegava com destino ao porto de Rio de Janeiro e deslocava-se para Pelotas. Sobre os motivos que os levaram a vir para cá, citavam a existência de parentes, amigos ou até oportunidades de trabalho. 

Quando os imigrantes chegavam à cidade, vinham praticamente sem recursos, dependendo da ajuda dos que moravam aqui há mais tempo e se encontravam estabelecidos. Cada uma das organizações judaicas, no entanto, ao mesmo tempo em que desenvolviam atividades religiosas, artísticas, educacionais e culturais, também se envolvia viabilizar financeiramente àqueles que necessitavam, através de entidades associadas que se denominavam Laispar-Casse, também chamadas de Sociedade de Amparo, mas funcionavam nos moldes de uma pequena cooperativa de crédito. 

Neste período, a imprensa registra a existência de duas organizações judaicas na cidade: a Sociedade Israelita Pelotense e o Centro Israelita Pelotense. Sua localização era próxima, a primeira à rua Félix da Cunha, 751 e a segunda na mesma rua, número 820. 

As duas associações mostravam-se bastante atuantes. A Sociedade Israelita Pelotense possuía uma biblioteca e um grupo organizado através da Juventude Israelita. Em 1928 fundam também um Centro Sionista, denominado “Filhos de Israel”. O Centro Israelita Pelotense, por seu turno, foi responsável pela construção de uma sinagoga, de uma escola, cujo nome era Colégio Israelita Dr. Raffalowitch e da Biblioteca Coletiva Israelita Pelotense. 

O Colégio Israelita Pelotense, fundado em 1928, ensinava hebraico, iídiche e religião e a cada final de período realizava apresentações teatrais. O aprendizado do iídiche era considerado fundamental por uma comunidade composta majoritariamente de “ashkenazim” – judeus originários do Leste Europeu. 

Uma boa parte dos filhos de imigrantes, ao concluir o ensino médio, partia para Porto Alegre, a fim de obter o diploma universitário. Muitos filhos deles ficaram por lá e acabaram casando, constituindo família. Este é um dos fatores que contribuiu para que a comunidade judaica em Pelotas diminuísse sua população. 

A vida cultural existia predominantemente relacionada às sociedades israelitas. Havia apresentações de teatro iídiche, cujos grupos teatrais, ao realizarem espetáculos em Porto Alegre ou até mesmo Buenos Aires, passavam por aqui: além da realização de operetas e da apresentação de cantores. Nas associações, os bailes de sábado eram mais constantes. 

A sua cultura, entendida como tradição, foi o ponto de união entre pessoas que tiveram origens, idiomas e, muitas vezes, vivências bastante diferenciadas, constituindo uma realidade multifacetada, onde através da memória coletiva perpetuaram valores éticos, manifestações artísticas, gostos e sabores. 

Hoje, nossa integração à sociedade gaúcha e brasileira é uma realidade, e as gerações de judeus que sucederam os primeiros imigrantes construíram, ao longo dessa trajetória de mais de 100 anos, uma identidade judaica, gaúcha e brasileira. 

"O elemento de identidade judaica não é excludente em relação a uma identidade brasileira. Devemos ter todas as identidades a que temos direito. Quanto mais conexões culturais e emocionais, melhor." Esta frase, do escritor Moacyr Scliar, ilustra bem a essência de nossa condição e sua contribuição ao multiculturalismo da sociedade brasileira. 

Apesar das dificuldades, a marca do judaísmo em Pelotas pode ter se tornado um pouco mais tênue, mas, com certeza, não se desfez. A memória de nossos primeiros imigrantes está preservada e seu legado está vivo, nos descendentes que ainda permanecem e fazem parte desta sociedade. 

Por este motivo somos muito gratos ao povo de Pelotas que recebeu nossos antepassados e devolveu a eles o significado de valores fundamentais à condição humana civilizada: sua dignidade e liberdade.      

À sociedade pelotense e a esta cidade que comemora 200 anos, nosso reconhecimento e profundo agradecimento pela acolhida aos que aqui vieram. 

Obrigado e Shalom

Jarbas Milititsky Presidente da FIRS 

Federação Israelita do Rio Grande do Sul 

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